Instagram Facebook Twitter Whatsapp
Dólar R$ 5,7833 | Euro R$ 6,2159
Search

Lei Paulo Gustavo: Como os fazedores de cultura avaliam o incentivo

Coletivos e fazedores de cultura de São Gonçalo e Niterói analisam a lei em importância depois de anos de descaso

relogio min de leitura | Escrito por Sofia Miranda | 18 de junho de 2023 - 15:26
Paulo Gustavo era natural de Niterói e trazia sempre em seus filmes o cenário do município
Paulo Gustavo era natural de Niterói e trazia sempre em seus filmes o cenário do município -

Entre vetos presidenciais e derrubadas pelo Congresso, por fim, a Lei Paulo Gustavo é uma realidade. "A Lei Paulo Gustavo é um golaço né?" Foi com essas palavras que o Superintendente do Museu Janete Costa de Arte Popular, Joel Vieira, qualificou o decreto de lei que repassa 3,8 bilhões para que estados e municípios invistam no setor cultural. A Lei Complementar nº 195, de 08 de julho de 2022 foi regulamentada quase um ano depois, no último 11 de maio, pelo Decreto 11.525, pelo presidente Luís Inácio Lula da Silva. 

No dia seguinte à assinatura do decreto, passou a vigorar um prazo de 60 dias para que os estados e municípios registrassem os planos de ação em uma plataforma no Ministério da Cultura. O Comitê Gestor divulgou o cronograma de liberação dos recursos nessa sexta-feira (16), para conferir o cronograma de transferência dos recursos, clique aqui

Os repasses da verba da LPG serão destinados a pessoas físicas, empresas e pessoas jurídicas sem fins lucrativos. Portanto, é imprescindível que a pessoa, seja física ou jurídica, atue na cultura. A verba sairá do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA) e do Fundo Nacional de Cultura (FNC). Dentro do setor diversificado que existe como cultura, é preciso atender a algumas restrições. Para ser beneficiário do edital, a atuação no setor cultural precisa estar associado às seguintes áreas, segundo o Ministério da Cultura: 

Produções audiovisuais

· Reforma, restauro, manutenção e funcionamento de salas de cinema

· Capacitação, formação e qualificação em audiovisual

· Apoio a cineclubes

· Realização de festivais e mostras

· Realização de rodadas de negócios

· Memória, preservação, e digitalização de obras e acervos

· Apoio a observatórios, publicações especializadas, pesquisas sobre o audiovisual

· Desenvolvimento de cidades de locação

· Apoio a micro e pequenas empresas

· Serviços independentes de vídeo por demanda, cujo catálogo seja composto por ao menos 70% de produções nacionais

· Licenciamento de produções audiovisuais para para a exibição em redes de televisão pública

· Distribuição de produções audiovisuais nacionais

Além disso, os recursos também contemplam outras linguagens artísticas como a criação de jogos eletrônicos, o teatro, o circo, a dança, a música, o artesanato; também serão investidos em culturas tradicionais que preservam as manifestações culturais de tradição, entre outros.


➣ LEIA TAMBÉM:   Grafiteira Cabocla é homenageada com exposição em shopping de SG

➣ LEIA TAMBÉM: Orquestra da Grota estreia espetáculo com concerto gratuito em Niterói

➣ LEIA TAMBÉM: Bauernfest de Petrópolis: confira a programação dos tradicionais desfiles


Depois de anos sendo tramitada no Congresso, entre tentativas de vetos do ex-presidente Jair Bolsonaro, a LPG resistiu e traz às casas de cultura, artistas independentes e coletivos, a esperança para que se possa sonhar novamente com a possibilidade de fazer cultura sem descaso ou negligência. É por esse motivo, que Joel Vieira comemora a aprovação da lei como se estivesse assistindo a uma partida de futebol, em que os jogadores são os produtores responsáveis por não deixar a arte morrer na sociedade, mesmo quando ela carece de incentivos.

Joel Vieira também é artista plástico
Joel Vieira também é artista plástico |  Foto: Filipe Aguiar
 

Em Niterói e em São Gonçalo, mesmo aqueles que não são beneficiários diretos, são também impactados pelo incentivo indireto à cultura, e trazem ânimos positivos a todos. "Uma das coisas que a gente preza é pelo artista da nossa cidade. São Gonçalo e Niterói são indissociáveis, a gente tem muita troca. Muito do que se produz lá (SG) se expõe aqui (Niterói). A gente tem como política pública fomentar a produção artística da cidade e da região. Então, toda lei de incentivo que venha beneficiar o artista daqui, a gente sempre recebe muito bem", contou o Superintendente, que também é artista plástico. 

Exposição no Museu Janete Costa de Arte Popular
Exposição no Museu Janete Costa de Arte Popular |  Foto: Filipe Aguiar
 

Joel também compartilhou o que significa o feixe de luz trazido pela LPG depois de alguns anos sombrios. ‘’A gente viveu um período aí no Brasil em que a cultura foi colocada como uma subfunção, foi desvalorizada completamente, e agora a gente percebe um novo clima, um novo ar e isso é muito animador. Nós estamos muito otimistas até pelo nosso entendimento do que é fazer cultura." compartilhou o diretor e artista. Localizado em Niterói, o Museu Janete Costa de Arte Popular, que dispõe de uma arquitetura antiga, além das exposições nos dois pisos do museu, também incentiva a produção artística acessível às pessoas com deficiência. 

Aprovação: expectativas x inseguranças
 

Segundo Joel, a possibilidade de fazer cultura esbarra na organização setorial que, durante alguns anos,  deixou de ser estabelecida. Contudo, através de políticas públicas a Fundação de Arte de Niterói (FAN) vem se responsabilizando para solucionar as pendências que ficaram pelo caminho. 

Apesar do positivismo que vem nascendo entre os artistas, umas das ressalvas acerca da lei dissemina a ideia de que a verba repassada pode comprometer o orçamento federal, explica Suzane Silveira, integrante e coordenadora do coletivo Escritoras Vivas, criado em 2018. "Alguns afirmam que seria um gasto a mais que dificultaria o cumprimento do teto de gastos, o que poderia comprometer o orçamento do Governo Federal. Porém, essa ressalva não faz o mínimo sentido, já que o dinheiro investido no setor cultural vem do Fundo Nacional de Cultura, recurso que estava parado, e que não impacta outros setores".

O coletivo Escritoras Vivas nasceu a partir do questionamento de onde estavam as mulheres escritoras de São Gonçalo. Debruçando-se sobre a questão, mulheres, mães e autoras se reuniram para fazer efervescer o cenário literário da cidade. Com o coletivo inscrito no edital, Suzane explica algumas das expectativas e inseguranças em relação à aprovação da lei. 

O Coletivo Escritoras Vivas foi criado em 2018 com o objetivo de dar protagonismo à literatura feita por mulheres
O Coletivo Escritoras Vivas foi criado em 2018 com o objetivo de dar protagonismo à literatura feita por mulheres |  Foto: Reprodução
 

‘’Acredito que a Lei ajudará na retomada e fortalecimento do setor cultural no país, especialmente para pequenos grupos e coletivos, ajudando no crescimento econômico local e estadual. O receio vem em relação à seleção dos projetos pela prefeitura, se terá transparência e imparcialidade. Caso aprovados, os recursos serão direcionados para a criação de oficinas para as escritoras do projeto", completa. 

➢ Bolsa Família paga valor extra e benefício é o maior da história

Para o Superintendente do Centro de Artes UFF Leornardo Guelman, a maior dificuldade na produção artística no cenário atual é a sustentabilidade. ''A maior dificuldade hoje é a sustentabilidade. Seja das instituições culturais já constituidas, seja dos produtores, é sempre assim. É como você vai tornar viável aquele empreendimento artístico, aquele projeto ou aquele produto. Então isso de fato precisa ser aprofundado, ou com o instrumento das leis, ou com a articulação interinstitucional, é nesse sentido que a gente move. É importante que cada instituição procure alinhar à sua narrativa ao projeto de Brasil. A cultura mais do que nunca vem sendo performatizada, ela não é um adereço, é algo que molda nossa sociedade, nosso padrão de conhecimento e de compreensão do mundo. 

Interior do Centro de Artes UFF
Interior do Centro de Artes UFF |  Foto: Filipe Aguiar
 

A Lei Paulo Gustavo, juntamente com a Aldir Blanc, nasceram durante a pandemia, que desestabilizou milhares de artistas que ficaram desamparados, já que o isolamento social ditava uma nova forma de viver. 

''Essas leis surgiram num contexto de emergência, né? Num contexto onde não se dava a oportunidade de apresentação dos artísticas, de espetáculos, não tinha público, então criou-se essa situação emergencial para poder de alguma forma dar uma sustentabilidade mínima para atores, músicos, e toda diversidade de trabalhadores da arte. Por outro lado, ultrapassando esse cenário da pandemia, ainda residual, essas leis demonstram uma agilidade, uma capacidade de retorno para a sociedade muito maior que a clássica Lei Rouanet, que está mais ajustada a produções artísticas de maior porte, à produtoras já consolidadas, inseridas no mercado e artistas de maior nome. As possibilidades da Lei Paulo Gustavo e Aldir Blanc abrem aí um outro cenário. Embora a LPG esteja mais associada ao audiovisual, você tem uma possibilidade maior de aproximação, então esses instrumentos vieram para ficar por um bom tempo.'' contou Leonardo. 

Já a Coordenadora Geral do Sistema de Bibliotecas Populares Municipais, Fernanda Frombach, diz que fazer cultura também vem desde a conscientização da população sobre a importância da produção artística. ‘’A questão do investimento requer muito cuidado, a gente tem investido nisso, mas a própria conscientização da população precisa ser estimulada. Nosso trabalho tem sido nesse sentido, os usuários e cidadãos são formadores de cultura, então aqui fazemos a divulgação de artes e isso é desenvolvido na nossa comunidade através de atividades, de literatura, de poesia, realização de oficinas. Isso é pensar no país, a importância desses decretos nos ajudam nas ações para fomentar e garantir subsídios para a população que não tem tantos recursos para isso.’’ 

Biblioteca Popular Cora Coralina
Biblioteca Popular Cora Coralina |  Foto: Filipe Aguiar
 
Repasses em Niterói
 

Procurada pela reportagem do OSG, a Prefeitura de Niterói revisou o plano de vigor da lei no município.

 ''Durante o mês de maio, a Secretaria Municipal das Culturas realizou uma consulta pública aberta para implementação na cidade da Lei Federal Paulo Gustavo. A  consulta servirá para levantamento de indicadores para a execução da Lei na cidade. O valor previsto do repasse do Governo Federal para Niterói pela Lei é de R$ 3,8 milhões.

Qualquer artista morador da cidade e maior de 18 anos pôde participar da consulta pública. A consulta trouxe questões como em qual modalidade o artista gostaria de participar em relação à lei e também sobre experiências com editais públicos de cultura. A consulta pública vai permitir que os artistas de Niterói possam participar da construção das bases da política cultural da cidade declarando suas demandas para a garantia de uma política cultural ampla e representativa. A partir daí, serão traçadas as diretrizes para a execução dos recursos provenientes da lei.''

A Lei Paulo Gustavo recebe o nome do humorista niteroiense que faleceu em 2019, vítima da pandemia de Covid-19. Como homenagem às suas realizações no audiovisual e a forma como revolucionou a comédia brasileira, o ator teve seu nome referenciado pelo decreto. 

Em São Gonçalo, a Secretaria de Turismo e Cultura da Prefeitura de São Gonçalo, em parceria com o Conselho Municipal de Cultura, vai realizar, nesta segunda-feira, dia 19 de junho, uma audiência pública sobre a implementação da Lei Paulo Gustavo, no Teatro Municipal de São Gonçalo.

O encontro será uma oportunidade para a classe artística da cidade conhecer a lei e entender como seus projetos artísticos podem ser viabilizados.

 Em São Gonçalo, a Lei Paulo Gustavo terá investimento de R$ 7,8 milhões, com 70% do montante destinado à produção audiovisual e 30% para demais artes.

*Sob supervisão de Cyntia Fonseca

Matérias Relacionadas