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De São Gonçalo para o mundo: vocalista de banda gonçalense relembra trajetória

Vocalista conta sobre trabalho com banda Donna Lolla e ONG Instituto dos Sonhos

relogio min de leitura | Escrito por Felipe Galeno | 11 de novembro de 2023 - 16:12
Grupo é formado pelo vocalista Rafael Vieira, guitarrista Jorge Veloso, baixista Ale Matias e baterista Junior Moraes
Grupo é formado pelo vocalista Rafael Vieira, guitarrista Jorge Veloso, baixista Ale Matias e baterista Junior Moraes -

Quem vê o nome da banda Donna Lolla em line-ups de festivais de música fora do estado e do país, talvez não imagine que a banda é formada por gonçalenses. Além de nascidos aqui, os músicos da banda de pop rock formaram o conjunto em São Gonçalo e chegaram a ter que juntar latinhas para conseguir comprar seus instrumentos musicais.

Com mais de duas décadas de atividade oficialmente, a banda foi fundada por Rafael Vieira, vocalista que, apesar de ter acumulado formações em outras áreas, vive de música desde a juventude. Junto dele, tocam o guitarrista Jorge Veloso, o baixista Ale Matias e o baterista Junior Moraes. Apesar de não ser muito popular na região, o grupo já emplacou músicas em novelas na TV aberta e acabou de voltar de Madrid, na Espanha, onde se apresentou pela primeira vez no Festival Hola Rio.


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“Era um sonho de moleque, mas não imaginava”, celebra Rafael. Com a banda de adolescente batizada em homenagem à sua avó, ele hoje não só faz música como coordena o Instituto dos Sonhos, organização que atua na cidade através de projetos sociais e ações culturais como uma escola de música para menores e a orquestra Filarmônica Metropolitana.

O grupo nem imaginava tirar essas ideias do papel quando começou, com dificuldades até para conseguir os instrumentos com os quais pretendiam se apresentar. “A gente ia tocar, mas não tinha instrumentos. Um cara, colega que nós chamávamos de Seu Sousa, falou: ‘por que vocês não catam latinha para comprar instrumento?’. Como a gente não tinha vergonha de nada , a gente começou a catar latinhas. Compramos nossos primeiros instrumentos assim e montamos a banda”, relembra o vocalista.

Vocalista lembra que precisou catar latinhas para conseguir comprar instrumentos
Vocalista lembra que precisou catar latinhas para conseguir comprar instrumentos |  Foto: Layla Mussi

Primeiras oportunidades

As apresentações, bem humildes, foram se acumulando e despertaram no artista o sonho de continuar fazendo isso pelo resto da vida. “Chegou um momento em que percebi que queria viver da arte, da banda. Era uma coisa muito ‘contra tudo e contra todos’, no sentido de que as pessoas ainda não entendiam que isso era uma profissão. Até hoje, as pessoas aqui na cidade tratam arte e esporte muito como loteria; ou você vira um Vinicius Jr, um Orochi, ou você vira um ferrado”, opina Rafael.

Os perrengues da trajetória artística na cidade, naturalmente, vieram; Junto deles, algumas mudanças de formação na banda. Ainda assim, Rafael continuou seguindo em frente com o projeto, motivado tanto por oportunidades que foram surgindo quanto pela obstinação em fazer jus a personalidade sonhadora que geralmente buscava trazer para suas letras e composições.

“Era um sonho de moleque, mas não imaginava”, conta
“Era um sonho de moleque, mas não imaginava”, conta |  Foto: Divulgação

“Quando botei a primeira música em novela, eu tinha 21, 22 anos. Foi na novela ‘Amor e Intrigas’, na Record. Depois, a novela foi vendida para Portugal e, obviamente, a trilha sonora era a mesma, o que foi dando mais espaço para a gente. Tivemos música também na ‘Mutantes: Caminhos do Coração’. Aí nós começamos a receber alguns convites para fazer show fora, fizemos ‘Brazilian Day’ em Toronto, fizemos [shows] em festivais de cinema. A vida foi abençoando, dando as oportunidades certas”, explica o artista.

Cadeia produtiva de cultura

Paralelo a isso, o gonçalense também começou a encontrar cada vez mais seu espaço no cenário da produção cultural local, que se tornou sua maneira de transformar a carreira artística ainda mais em uma profissão. No caminho, entretanto, acabou esbarrando em algumas dificuldades de fazer isso na cidade onde nasceu e cresceu.

“Quando eu comecei a trabalhar com arte e cultura eu era muito novo, por causa da banda, mas já enxergava ali a possibilidade de profissionalização. Só que aqui na nossa cidade, no contrafluxo, pouco se falava sobre profissionalização na cadeia produtiva de cultura. Termos simples, como economia criativa, economia da cultura, nunca foram termos usados na cidade porque nunca houve investimento de política pública da cidade em cultura do ponto de vista de negócios”, desabafa Rafael.

“Chegou um momento em que percebi que queria viver da arte, da banda", relembra artista
“Chegou um momento em que percebi que queria viver da arte, da banda", relembra artista |  Foto: Layla Mussi

Para tentar driblar esse cenário, o músico resolveu ampliar as especializações; acumulou aprendizados de turismo, direito, contabilidade e resolveu usar os recursos que conquistou através da banda em iniciativas culturais. Foi assim que fundou o Instituto dos Sonhos, organização não-governamental que, há 19 anos, trabalha com projetos culturais que promovam desenvolvimento social na região.

Aulas de música e orquestra

A mais ‘badalada’ dessas propostas é a da Escola de Música, que acontece na Igreja Matriz São Gonçalo do Amarante, no Centro. A iniciativa oferece aulas gratuitas de musicalização e de diferentes instrumentos musicais para jovens de 6 a 19 anos, inscritos através das redes da ONG. O vocalista da Donna Lolla conta que a ideia é, com o apoio de educadores profissionais, proporcionar às crianças a formação musical que ele queria ter tido na juventude.

Aulas gratuitas acontecem na Igreja Matriz de São Gonçalo
Aulas gratuitas acontecem na Igreja Matriz de São Gonçalo |  Foto: Divulgação

“Eu acredito muito no processo de educação e, para esse processo funcionar, você tem que ofertar coisas boas, porque é isso que vai mudar a visão das pessoas. Eu, mesmo sendo músico a minha vida toda, não tive formação pedagógica para trabalhar com crianças pequenas, que precisam de necessidades especiais”, explica Rafael.

Além das aulas, a ONG também tenta promover democratização ao acesso à cultura através da Orquestra Filarmônica Metropolitana. Formada por artistas de diversas regiões do estado, com a maioria de gonçalenses, a ideia, segundo o fundador da ONG, é despertar o interesse nas plateias locais por concertos através de apresentações com músicas que façam parte do imaginário popular local.

"A gente propõe levar concertos para lugares que não têm acesso a concertos. A gente se apresenta em teatros também, mas a gente gosta de fazer apresentações que circulam. É mais fácil levar a orquestra até as pessoas que as pessoas até ela", explica o vocalista.

"É mais fácil levar a orquestra até as pessoas", acredita fundador da ONG
"É mais fácil levar a orquestra até as pessoas", acredita fundador da ONG |  Foto: Divulgação

“Nada contra Beethoven, Tchaikovsky, óbvio que merecem todo o respeito, mas isso não faz parte da nossa cultura. Meu maestro escuta muita música clássica por opção, mas tem muita gente da nossa cidade que nunca ouviu Tchaikovsky, mas ouvia Claudinho e Buchecha. Então, quando você dá às pessoas a chance de se identificarem com o repertório, cresce a possibilidade de haver um interesse e uma frequência maior para concertos”, defende Rafael.

A melhor parte, segundo ele, é poder mover esse tipo de iniciativa fazendo o que mais gosta: tocando suas composições em palcos pelo mundo. Por mais que objetive chegar a ainda mais lugares com a Donna Lolla e o Instituto dos Sonhos, Rafael tem orgulho do que já pôde construir.

“Eu acho um privilégio poder passar uns vinte, trinta dias na Europa tocando, sabendo tudo que a gente passou na vida, que a gente já cantou latinha lá no começo. São coisas que dão mais motivação para trabalhar, se sente inspirado para seguir”, conclui o artista.

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