Lutador de Niterói se prepara para se despedir dos ringues com luta aberta ao público
Wallace Madimbu planeja evento esportivo em Santa Bárbara
Depois de mais de vinte anos em cima dos ringues, o 'lutador de Santa Bárbara', Wallace "Madimbu" Farias, se prepara para dar encerrar sua carreira, com uma luta final marcada para dezembro. Desta vez, porém, a disputa é especial; o campeão mundial vai se despedir do boxe em um 'duelo' gratuito, aberta ao público, no Complexo Esportivo de Santa Bárbara, em Niterói.
Professor de lutas em um centro de treinamentos na Rua Mário Victor de Assis Pacheco, o atleta, de 42 anos, está realizando uma arrecadação online e se dedicando aos treinos para realizar o evento, que tem um significado especial para ele, justo pelo local onde vai acontecer. "Eu quero encerrar minha carreira no meu bairro. Foi o bairro que me criou, foi onde fiz meu nome. Quero encerrar aqui em Santa Bárbara. O público daqui pediu tanto para ver minhas lutas que agora quero fazer um evento aberto ao público, para todo mundo poder ir", afirma.
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Essa é a segunda vez que Madimbu se aposenta da luta. Em 2017, ele já havia encerrado a carreira no kickboxing, esporte que praticava desde os anos 90. Desde então, vem diminuindo o ritmo também no boxe e concentrando os esforços nas aulas de luta que oferece em seu CT. Com o tempo e a correria para conciliar as duas coisas, acabou decidindo que é hora de pendurar as luvas.
"Achei que era o momento de parar", explicou Madimbu. Com isso, encerra também uma coletânea de títulos, já que, entre o kickboxing e o boxe inglês, ele acumula seis campeonatos pan-americanos, quinze campeonatos nacionais, cinco Copas do Brasil e treze títulos estaduais, além de uma vitória na Copa do Mundo de kickboxing, na modalidade full contact.
Ele relembra que não imaginava que sua trajetória seria tão cheia de vitórias quando começou a lutar, na adolescência. Niteroiense de berço, ele se mudou para Santa Bárbara ainda na infância e por lá conheceu a rotina dos centros de treinamento. A paixão pelo esporte só surgiu mesmo quando assistiu a Kickboxer - O Desafio do Dragão (1989), filme de ação americano que fez sucesso na TV brasileira no início dos anos 90.
“Quando eu fui assistir o filme do Jean Claude Van Damme, me apaixonei pelos filmes do cara e pelo esporte. Na época, eu não conhecia o estilo de luta que fazia, mal sabia o que estava fazendo. Quando passava uma luta dessas na TV, eu falava para o meu pai: ‘ih, tá passando boxe com perna’”, relembra.
Foi no 'boxe com perna' que aprimorou suas habilidades até chegar, em 2000, à sua primeira grande luta, na final de um Campeonato Pan-Americano. Mesmo quebrando o braço no meio da disputa, ele conseguiu nocautear o adversário e conquistou o primeiro dos muitos títulos da carreira.
No mesmo ano, ele conheceu o boxe inglês e começou a conciliar as duas carreiras. De lá para cá, passou por algumas fases mais complicadas, como a época em que o excesso de treinos lhe rendeu alguns problemas de saúde, e outras que lembra com maior orgulho, como a vez em que representou a cidade de Niterói no percurso da tocha dos Jogos Pan-Americanos de 2007.
"Eu até fiquei surpreso quando recebi a carta dizendo que ia ser condutor da tocha olímpica. Na minha mente, eu achava que só gente famosa, que aparece em televisão, podia carregar a tocha", brinca o boxeador.
Tudo isso ajudou a construir sua fama nos círculos do esporte e também no bairro onde vive. Pelo menos em Santa Bárbara, seu rosto é a 'cara' oficial da luta brasileira, por mais que a maior parte dos vizinhos e moradores nunca tenha tido a oportunidade de vê-lo lutar ao vivo. Como suas disputas sempre aconteciam em outras cidades, estados e até em outros países, muitos de seus fãs não conseguiam acompanhar suas lutas.
Por isso, também, a luta final de dezembro é tão importante para ele. "O público daqui pediu tanto para ver minhas lutas que agora quero fazer um evento aberto ao público, para todo mundo poder ir", ele explica. Seu objetivo principal, no entanto, é fazer com que o evento desperte o interesse de potenciais futuros atletas no bairro.
"Vai ser o primeiro evento esportivo de lutas assim no bairro e espero que o primeiro de muitos", prevê o lutador. "A minha intenção de fazer esse evento é mostrar o que é o esporte para os jovens e gente de mais idade, aqui no bairro. Tem pessoas que chegam para as artes marciais visando a violência. E esporte não é violência. Esporte é cultura, é educação. Eu, por exemplo, era muito brigão. Brigava por causa de tudo na adolescência. Depois que entrei no mundo da luta, passei a ser de boa".
Seu trabalho de preparação de futuros atletas e entusiastas da luta já acontece no C.T. Madimbu, logo acima de sua própria residência, onde treina participantes do projeto social BSK Brasil para aulas de boxe no fim da tarde e alunos de kickboxing para aulas à noite.
Nessas aulas, recebe moradores de diferentes idades e os introduz no universo do esporte. Alguns já chegam com alguma familiaridade. Outros, como a massoterapeuta Katiane Telles, de 41 anos, tiveram que começar do zero e hoje á não se veem mais sem o esporte em suas vidas.
"Eu só comecei a lutar porque descobri um hipotireoidismo, que fez com que o funcionamento do metabolismo fique lento. Então, eu precisava praticar um esporte, fazer alguma coisa que acelerasse o metabolismo. Como eu não gosto de malhar, detesto musculação, eu resolvi tentar o kickboxing", ela conta.
Atualmente, é faixa azul no esporte e já cogita trazer o aprendizado esportivo para a vida profissional. "Eu faço até pensando já em uma transição de carreira. É uma coisa que eu gosto. E o mestre sempre incentiva, sempre fala para fazer cursos", explica Katiane.
"Sempre falo para eles buscarem a faixa preta, construírem sua história", complementa Madimbu, orgulhoso. Para além das artes marciais, outra coisa que se dedica a passar para os alunos é a importância de valorizar sua trajetória e 'curtir a viagem'. No caso de sua história pessoal, ele faz isso registrando meticulosamente sua rotina em um diário e acumulando fotografias por todos os cantos de sua casa.
São milhares de fotos penduradas nas paredes, em banners e painéis por todos os cômodos de sua casa, com a exceção do banheiro. Fotos de vitórias, de derrotas, de alunos treinados, de lutadores e figuras públicas que o inspiram cercam quem passa pelo interior de sua casa.
"Eu escrevo tudo, guardo todas as fotos. Quem vê, pergunta: ‘caraca, que tanta foto é essa?’. Mas aquilo ali é minha história. É uma forma de me lembrar e mostrar para os meus alunos os caminhos por onde eu estive", ele justifica.
Esses caminhos, esclarece Wallace Madimbu, vão continuar, mesmo fora dos ringues. Segundo o lutador, ele se aposenta das lutas, mas planeja seguir treinando seus alunos e, portanto, bem próximo do universo esportivo. "Dar aula, botar atleta para lutar em campeonato; isso daí é minha vida. Eu vivo da luta. Eu já larguei emprego de carteira assinada, na época, para viver da luta. Eu vou continuar", conclui.
A arrecadação de verba para a luta acontece através de uma vaquinha online. Interessados em doar, podem ajudar no link: www.vakinha.com.br/vaquinha/madimbu-figth-a-grande-luta