Mestres do trabalho manual: sapateiro usa arte com maestria para dar vida nova ao que parece finito
No quarto e último capítulo da série, OSG traz a história por trás da experiência de Elias Rodrigues
Após contar a história da artesã Julia Loyola, do ourives e relojoeiro Jairzinho de Souza e da costureira Vera Lúcia, o quarto e último capítulo da série de O SÃO GONÇALO, "Mestres do trabalho manual", conta a história de Elias Rodrigues, sapateiro que, fugindo dos padrões das profissões antigas que são passadas "de pai pra filho", iniciou no ofício por conta própria, se tornando um experiente e apaixonado profissional das artes manuais.
Sapateiro sim, senhor
Sobrevivendo ao longo dos séculos, a profissão de sapateiro — aquele que, com arte e maestria, manuseia artesanalmente todo tipo de sapato — conta com as mãos sábias de profissionais apaixonados, que, com habilidade, fazem renascer algo que, para a maioria das pessoas, poderia parecer velho ou acabado.
Natural de São Fidélis, no interior do estado do Rio, Elias Rodrigues Dias, de 59 anos, chegou a São Gonçalo aos 12 anos e, como era de costume na época, logo foi procurar uma atividade, mesmo ainda tão jovem. Aos 14 anos, Elias começou a trabalhar em uma sapataria gonçalense para realizar o trabalho de limpeza. A partir desse momento, o profissional apaixonou-se pelo ofício, em que atua há 45 anos.
"Naquela época, os garotos entravam na profissão bem cedo. Um amigo me levou à sapataria, e eu aproveitei a oportunidade. Fui aprendendo, e com um ano dentro do local eu já era 'meio oficial'. Foi a minha faculdade; fiquei sete anos nesse lugar", contou Elias.
Durante sua trajetória profissional, o sapateiro chegou a se aventurar em outro ramo durante quatro anos, mas retornou para a profissão que sempre o fez feliz e realizado. Nesse momento, aos 22 anos, Elias resolveu montar sua própria sapataria.
"Depois que abri a primeira loja, fui para o Boaçu, onde fiquei por 32 anos. Fiz clientes que viraram amigos, que me acompanham até hoje, e isso é muito gratificante", contou o sapateiro.
Leia também:
Prefeitura de Paraty abre concurso público com 324 vagas e salários de até R$ 8.627,64
Conta de luz mais cara: Aneel muda bandeira tarifária para vermelha em setembro
"Mas depois de todo esse tempo no bairro, chegou a hora de sair. E depois de namorar o Rocha por um bom tempo, já estou aqui há quase cinco anos. Estamos aí sempre na luta, trabalhando e fazendo o que faço por amor. A gente tem que valorizar a nossa profissão, então faço tudo com amor", completou.
Casado há 29 anos, pai de três filhas e avô de três netos, Elias, que sempre trabalhou sozinho, é um caso raro na profissão, visto que esse ofício tão antigo, para ele, não foi passado de geração em geração.
"Geralmente, a profissão de sapateiro passa de pai para filho, e no meu caso não foi assim. Meu pai era vigilante de uma empresa, então foi a partir do meu próprio interesse que comecei na profissão. Depois, ainda passei o conhecimento para um dos meus irmãos, que até hoje também trabalha como sapateiro", explicou Elias.
Serviços do "Sapateiro Elias"
Simpático, solícito e prestativo em cada uma das funções que desempenha individualmente em sua loja, Elias trabalha com sapatos, cintos, bolsas, malas, cadeiras de praia e tudo que envolva o uso de máquinas e costura à mão.
"Antigamente, o processo de trabalho era mais difícil, porque hoje tudo o que você compra é praticamente pronto; antigamente, você tinha que fazer do zero. Para uma sola de couro, por exemplo, você tinha que comprar uma placa, cortar, preparar, molhar, rebater, e hoje já se consegue comprar tudo pronto, só colar e costurar. Mas, ao mesmo tempo, a procura dos clientes era muito maior e foi ficando escassa devido à evolução, que acabou tirando muito do trabalho humano, dando lugar às máquinas. Mas sempre tive uma ótima relação com os clientes, e isso ajuda muito no dia a dia. Eu não valorizo só o meu trabalho, valorizo o dinheiro que as pessoas estão pagando. Sempre falo com os meus clientes que, se eles estão pagando, é para que fique bom, que fique excelente", afirmou o sapateiro.
A jornada dos sapateiros ao longo da história se mistura com a própria evolução da sociedade, através de um testemunho de criatividade e paixão pelo ofício. Mesmo que possa vir a se tornar totalmente obsoleta nos próximos anos, de fato, a profissão de sapateiro deixará para sempre rastros de um trabalho inigualável, artístico, que remonta à tradição da cultura de uma infinidade de gerações.
"Sou muito feliz sendo sapateiro. É o que aprendi a fazer, e procuro fazer bem feito. Gostaria de passar isso para as futuras gerações da minha família, mas como não tive filho homem, ficou mais difícil. Os netos também estão seguindo outros caminhos e fico feliz por eles, mas gostaria de passar isso adiante. Mas, graças a Deus, consegui realizar muitos sonhos através da minha profissão, como ter a minha casa própria, meu carro, além de sempre sustentar minha família. Tenho duas filhas formadas, o que também foi um sonho realizado, tudo graças ao esforço do meu trabalho. Esse negócio de querer ficar rico não enche meus olhos; o que peço todos os dias a Deus é saúde. Dinheiro não é tudo na vida da gente. Ter família, uma base religiosa, isso é o que almejo. Daqui uns anos, estarei me aposentando, mas não penso em parar. Vou continuar trabalhando até quando Deus permitir, porque posso até não ter tudo que quero, mas tenho tudo que é necessário para viver", afirmou Elias.
A sapataria de Elias fica localizada na Av. Humberto de Alencar Castelo Branco, 3242, na galeria ao lado da Casa do Biscoito, no bairro Rocha, em São Gonçalo. O horário de funcionamento é de segunda à sexta, das 8h às 18h e sábado das 8h às 13h.