Sem celular na volta às aulas: pais e professores revelam suas expectativas com a nova lei
Segundo o Ministério da Educação (MEC), a nova medida tem como meta proteger as crianças e adolescentes dos impactos negativos das telas na saúde mental, física e psíquica
O ano letivo começa oficialmente na próxima segunda-feira (10) e, com ele, uma mudança que tem dado o que falar no mundo da educação: a determinação da Lei Federal 15.100, que limita o uso de dispositivos eletrônicos portáteis nas escolas públicas e privadas. Com a adesão da nova medida, dúvidas e expectativas tomaram conta da vida de pais e professores, que se viram diante de uma nova realidade que, de acordo com o Ministério da Educação (MEC), tem como objetivo proteger as crianças e adolescentes dos impactos negativos das telas na saúde mental, física e psíquica.
Sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 13 de janeiro de 2025, a lei ainda passa por regulamentações para que seja aplicada de maneira correta. Para isso, o MEC vem preparando uma regulamentação que deve ser divulgada até o fim de fevereiro. Até lá, fica a cargo das unidades de ensino definirem suas próprias estratégias para essa implementação.Para auxiliar esse processo, o MEC divulgou manuais para escolas e redes de ensino, citando casos onde a proibição já está em vigor e dados para embasar a medida.
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Desafios na prática
As restrições ao uso de celulares nas escolas do país trazem também um grande desafio aos pais e professores, que se veem diante de uma nova realidade, onde, na prática, os conflitos provenientes de uma "proibição" também podem exigir "pulso firme" na decisão.
Embora a nova lei seja bem vista por grande parte da sociedade e da comunidade escolar, alguns pontos ressaltam a importância de uma implementação aplicada de forma correta e consciente:
- falta de infraestrutura nas instituições de ensino para guardar os celulares em segurança;
-formação de professores para que não abram mão do uso pedagógico das novas tecnologias;
- tornar as aulas atrativas para os alunos a ponto de que o foco seja destinado ao aprendizado.
Diante de dúvidas e opiniões sobre este novo momento, às vésperas da volta às aulas, a reportagem de O SÃO GONÇALO conversou com um professor da rede estadual do Rio de Janeiro e uma mãe de dois alunos da rede privada de São Gonçalo para compreender o momento de mudanças dentro da educação e a melhor maneira de se lidar com possíveis reações negativas de crianças e adolescentes.
Para o professor de Sociologia e Geografia Jairo Moraes, de 43 anos, o uso de celulares e outros dispositivos eletrônicos de maneira desordenada dentro do ambiente escolar pode ser visto como um fator negativo.
"O uso de celulares no ambiente escolar é um tema de grande relevância na sociedade contemporânea e as novas dinâmicas de ensino-aprendizagem e socialização digitais. O uso indiscriminado prejudica o desenvolvimento integral dos estudantes pois interfere na aprendizagem e concentração dos mesmos. Podemos nos fundamentar em pesquisas nos países que já adotaram tais práticas na Europa que apontam nesse sentido. Esta proibição não significa a abolição do uso das novas tecnologias, mas sim direciona as atividades com celulares e dispositivos eletrônicos para fins pedagógicos no ambiente escolar mediado pelos professores e professoras", explicou o professor, que atua desde 2010 no Colégio Estadual Pandiá Calógeras (Alcântara) e no Colégio Estadual Frederico Azevedo (Itaúna), ambos em São Gonçalo.
De acordo com o educador, a medida também pode contribuir para a construção de ambientes escolares mais conscientizados e prevenidos de todas as formas de violência, inclusive o bullying e o cyberbullying. No ano passado, cartórios de notas do Brasil registraram um aumento de aproximadamente 12% na média anual de casos de bullying e cyberbullying. Esse aumento foi documentado por meio de solicitações de atas notariais, que comprovam os ataques. Os casos podem variar de xingamentos e ofensas a agressões físicas mais graves, podendo até evoluir para ataques a escolas, homicídios e outros crimes.
"O que tem ocorrido também é uma redução dos níveis de aprendizagem dos estudantes de forma geral, fazendo com que não haja foco no aprendizado e nas diversas formas de interação social que os ambientes escolares proporcionam. Diversos estudos já mostram que a simples presença de dispositivos móveis nos ambientes escolares causa distração, falta de atenção e prejuízo ao desempenho acadêmico. Além disso, a exposição prolongada às redes sociais e à internet pode levar ao isolamento social e à ansiedade, afetando a saúde psicológica dos estudantes. São fundamentais os tempos de socialização nos intervalos e recreios entre os estudantes, e a ausência do uso de celulares pode ser usada como incentivo às atividades lúdicas e de desenvolvimento social e emocional das crianças", disse Jairo Moraes.
A nova lei abre exceções para estudantes que precisem do celular por razões de acessibilidade, inclusão ou condições de saúde, além de permitir o uso dos aparelhos "para fins estritamente pedagógicos ou didáticos, conforme orientação dos profissionais de educação".
Apoio dentro e fora da escola
Enquanto isso, fora do ambiente escolar, pais e responsáveis também têm papel fundamental na implementação da nova lei, visto que é necessário que o diálogo dentro e fora da escola seja coeso e consistente diante do papel dos pais no reforço às regras em casa e na conscientização dos filhos sobre os impactos negativos do uso das telas.
Nas orientações às escolas, o MEC reforça a atribuição dos pais, de modo que sejam informados sobre as regras e reforcem as medidas em casa, esclarecendo também sobre os impactos negativos do uso das telas.
Mãe de dois, a cabeleireira Luana França, de 40 anos, viu a nova lei como um ponto de apoio na diminuição do uso excessivo de telas por parte das crianças.
"Acho que ainda está em processo de adaptação, porque na escola do meu filho ainda não falaram nada sobre isso, enquanto na da minha filha já estão pedindo realmente para que os alunos não utilizem o celular na sala de aula e principalmente quando estiverem interagindo com outros colegas. A princípio, está sendo só na conversa, por meio de diálogo com os alunos, sem uma restrição mais severa", contou Luana França, que é mãe de Kauã, de 9 anos, e Manuella, de 13 anos.
No começo, minha filha ficou meio chateada, mas eu conversei com ela, porque acho que os pais também têm que colaborar, ajudar a escola nesse processo. Porque, de certa forma, isso é para o bem deles, vai ajudar a prestarem mais atenção na aula e ajudar na interação entre eles. E vamos ser sinceros, as crianças ultimamente têm ficado muito focadas na tela do celular e esquecem de olhar olho no olho, não brincam mais, não têm mais diálogo, a vida delas é tela, seja por celular, seja por televisão. Então, para mim, foi uma medida muito positiva, achei ótimo", afirmou Luana.
Dados do Programa de Avaliação de Estudantes (Pisa), uma avaliação internacional, concluiu que oito em cada dez estudantes brasileiros de 15 anos assumiram ter se distraído com o celular nas aulas de matemática.
Segundo o MEC, o principal objetivo da nova lei é permitir que os alunos participem das atividades e interajam. Estudos avaliados pelo MEC apontam que o uso excessivo de telas prejudica o desempenho acadêmico, reduz a interação social e aumenta as chances de depressão e ansiedade entre os jovens.