Família tenta provar inocência de homem preso após ser reconhecido por foto tirada há 14 anos
Mais de 28 mil pessoas assinaram a petição pedindo a soltura de Laudei Oliveira
Familiares de Laudei Oliveira da Silva, de 41 anos, morador do Morro do Estado, em Niterói, se revoltaram com prisão, dita por eles irregular, do guardador de carros em junho deste ano. Figura bastante conhecida no entorno do Shopping Plaza, em Niterói, Laudei trabalhava há 20 anos, dia e noite, fazendo a 'segurança' dos carros na rua. Mas agora, o pai de três filhos está preso há três meses e sete dias, no Presídio Evaristo de Moraes, no bairro de São Cristóvão, no Rio.
Laudei foi preso acusado de participar de um assalto no dia 13 de fevereiro na Praça da Cantareira, em São Domingos, Niterói, ao lado do filho, Ronald Fonseca Oliveira da Silva, de 20 anos, também detido. O pedido da prisão foi expedido pela 1ª Vara Criminal de Niterói e informado para ele no dia 23 de junho, data em que foi levado para o presídio.
Segundo informações passadas por familiares de Laudei, as vítimas do roubo disseram que haviam sido abordadas por dois homens, sendo que um deles teria entre 20 a 30 anos, era magro, alto, de cor parda e sem barba. Ao chegarem na delegacia, as vítimas teriam reconhecido Laudei por uma foto tirada quando ele tinha 27 anos, quando ele foi detido por estar fumando um cigarro de maconha. A imagem, contudo, segundo os familiares do acusado, ficou registrada na Polícia Civil e foi usada para o reconhecimento.
A esposa de Laudei, Renata Rodrigues, de 29 anos, explica que seu marido tinha a ficha limpa. Segundo a mulher, tudo já havia sido resolvido na época, ficando Laudei sem nenhuma pendência com a justiça. Ela disse ainda que as vítimas relataram que no momento do assalto, Laudei estaria conduzindo o veículo, o que, para ela, não procede, já que, segundo a mesma, o seu marido não sabe dirigir. Além disso, Renata afirmou que a descrição física não bate com a aparência atual de Laudei, que atualmente está acima do peso, com barba e é baixo.
Para Renata, o que aconteceu com o seu marido foi uma injustiça e ela segue confiando que seu companheiro é realmente inocente e está preso por um crime que ele não cometeu. "A dor que estamos passando não dá para descrever. Levaram o meu marido só por ser pobre e trabalhador em uma atividade que é mal vista pelos outros. Ele é honesto", se desespera Renata.
Segundo a família, Laudei estava trabalhando no momento do crime e não tinha contato com o filho há anos por não concordar com o caminho que ele estava seguindo. Diversas pessoas aceitaram testemunhar a favor do guardador de carros para contar que estavam com ele no dia e no horário do roubo.
Até mesmo o filho Ronald, que confessou participação no crime para a esposa de Laudei, disse durante conversa pelo Facebook que o pai era inocente e não estava com ele no momento do roubo. Mas essa versão nem chegou ainda a ser colocada no Tribunal de Justiça, pois ele foi preso através de um mandado de prisão e preferiu se manter em silêncio, excluindo o seu direito de contar a sua versão dos fatos. Enquanto isso, seu pai também segue preso, pagando pelo ato que diz não ter cometido.
Ao todo, mais de 28 mil pessoas já assinaram uma petição online que protesta contra a prisão de Laudei. "Foram muitas pessoas que abraçaram a causa, se ele fosse realmente culpado, será que toda essa gente estaria tentando tirar meu marido da prisão?", indaga Renata.
A mãe de Laudei, dona Maria de Lurdes Oliveira, de 63 anos, também está desesperada vendo a situação que o seu filho se encontra. "Meu filho está lá dentro chorando, precisando do meu colo. Meu filho está doente, sofre com problemas de pressão, ele não merecia estar passando por isso. Criei meu filho muito bem, ele não fez nada disso que estão acusando ele", desabafa a idosa que diz não conseguir parar de chorar toda vez que pensa em Laudei.
Em uma primeira tentativa de retirar Laudei das grades, o advogado do acusado, Edney Alves de Carvalho conseguiu um habeas corpus concedido pela desembargadora Suimei Meira Cavalieri, no dia 22 de setembro, na 3ª Câmara Criminal, em que ela deixa claro que o reconhecimento por foto de 14 anos atrás é precário.
“Não se questiona a adoção do reconhecimento fotográfico como meio de prova [...]. Todavia, no caso em apreço, o reconhecimento se mostra frágil, pois a imagem utilizada não guarda correspondência com a realidade atual física do paciente, levando-se em consideração que um jovem de vinte e cinco anos possui aparência distinta de um homem de mais de quarenta”, diz um trecho do pedido.
A desembargadora solicita ainda o alvará de soltura de Laudei, pedindo que ele compareça mensalmente à Justiça. “Concede-se parcialmente a ordem, impondo se ao paciente medida alternativa de comparecimento mensal ao juízo da comarca de residência para informar e justificar suas atividades”, determinou no processo.
Contudo, o pedido foi barrado no dia 25 de fevereiro, por causa de um outro processo criminal, instaurado pelo juiz João Guilherme Chaves Rosa Filho. Neste novo processo, o nome de Laudei é relacionado. Tanto o advogado quanto a família de Laudei foram pegos de surpresa. Acontece que Laudei estava sendo acusado de um outro roubo, desta vez de uma moto. O crime teria ocorrido uma semana depois do roubo na Cantareira, em Niterói.
A esposa de Laudei também nega que ele tenha roubado a moto: “Mais uma vez colocaram isso nas costas do meu marido. Ele estava trabalhando neste dia, e tem outras testemunhas que conseguem provar isso”, diz ela. O advogado também informou que neste novo processo envolvendo o seu cliente, a vítima ficou na dúvida se era mesmo Laudei o autor do crime.
Em uma segunda tentativa, o advogado Edney Alves vai solicitar o relaxamento da prisão usando os mesmo argumentos detalhados no primeiro habeas corpus. “Acredito que até segunda (5) o desembargador já tenha uma resposta para a gente”, diz Edney.
Até o momento, o que a família sabe de concreto é que a primeira audiência está marcada para o dia 12 de novembro. Enquanto isso, ele ficará preso no Presídio de São Cristóvão respondendo por dois crimes de roubo sem que nenhuma das vítimas envolvidas o tenham reconhecido presencialmente.
O Ministério Público foi procurado para esclarecer quais tipos de provas utilizou para oferecer denúncia contra Laudei. Em nota, a Promotoria de Justiça que atua junto à 1ª Vara Criminal esclareceu que o réu Laudei Oliveira da Silva está preso pelo fato de a vítima tê-lo reconhecido, inequivocamente, através de fotografia colorida e nítida, como sendo o autor do grave crime. "Não consta qualquer negativa de autoria nos autos por parte do réu e de Ronald Fonseca Oliveira da Silva".
A Promotoria ressaltou ainda que "Laudei também figura como réu no feito nº 0013497-75.2020.8.29.0002, pela prática de um roubo duplamente majorado, havendo feito a decretação de prisão preventiva".
Recentemente, o jornal O São Gonçalo contou a história do jovem Danillo Félix que também foi preso após ser reconhecido, através de fotos, como autor de um roubo em Niterói. Neste caso, no entanto, a defesa conseguiu provar que as fotos usadas eram antigas e ele acabou absolvido. Assim como Danilo, Laudei também foi reconhecido por foto, na mesma delegacia, a 76ªDP (Niterói).
*Estagiária sob supervisão de Thiago Soares