AUTISMO, “HUMOR AZUL” E “O QUE ME FAZ PULAR”
“Humor Azul, o lado engraçado do autismo”, de autoria de Rodrigo Tramonte, diagnosticado com um dos espectros deste transtorno, é um livro que todos os educadores e todas as demais pessoas deveriam ler, independente do fato de lidar ou não com autistas. É inteligente, sensível, tratando de forma leve, clara e com graça um assunto que desestabiliza tantos pais e que é, de uma maneira geral, tão pouco conhecido: o autismo.
É o lado diferente de ver e viver a vida. Mas o diferente nem sempre é visto com bons olhos. Somos engavetados em relação à visão de mundo, cuja imagem já vem pronta e muitos caminhos a percorrer também já vêm traçados. Romper o status quo é um desafio que nem todos conseguem realizar ou mesmo aceitar.
No livro ‘Humor Azul, o lado engraçado da vida’, cujo protagonista é um menino de nome Zé Azul, percebe-se que, muitas vezes, na sua ação, a previsibilidade se muda em imprevisibilidade, a consistência em inconsistência e a certeza em incerteza. Há uma parte na história em que a mãe de Zé Azul o manda ir ao mercado buscar um litro de leite e completa o pedido: - Se tiver ovo, traz uma dúzia.
E o menino chega a casa com uma dúzia de caixas de leite, porque tinha ovo no mercado. Uma interpretação exata. Não há flexibilidade. Isto torna o autismo perturbador, mesmo para aqueles que passam todo o tempo em volta dele. As pessoas com este transtorno têm dificuldade de processamento sensorial, atraso e deficiência na fala/linguagem, ausência de habilidades sociais e extrema sensibilidade sonora.
Outro livro imperdível - ‘O que me faz pular’ – é de Naoki Higashida, que também é um autista e tinha 13 anos quando foi publicado em 2007. Imerso em seu próprio mundo, Naoki tem dificuldade de se comunicar e de socializar. No entanto, graças à paciência da mãe e de uma professora, aprendeu a se expressar. Através de uma invenção que envolve uma cartela de papelão com letras, ele conseguiu escrever seu livro. Numa das partes de sua escrita, Naoki diz: quando pulo, é como se meus sentimentos rumassem ao céu. Na verdade, minha necessidade de ser engolido pela imensidão lá em cima é suficiente para estremecer meu coração. [...] ao pular é como se eu estivesse me libertando das cordas que me prendem.
Em outro momento, explica: A verdade é que amamos ter companhia. Mas, como as coisas nunca dão certo, acabamos nos acostumando com a solidão sem perceber sequer como isso aconteceu. Toda vez que escuto alguém comentar o quanto eu prefiro ficar sozinho, isso me faz ficar solitário demais. E confessa: [...] Não estou sozinho quando estou com as letras. Elas são muito mais fáceis de controlar do que as palavras faladas e podemos estar com elas sempre que quisermos.
Apesar de todas as dificuldades, indivíduos com autismo têm nos mostrado, a cada dia, sua capacidade de compensar ou mudar muitas de suas características mais desafiadoras. Acreditar na evolução de cada criança é a chave nada mágica para um resultado gratificante, como aconteceu com Rodrigo Tramonte, Naoki Higashida e tantos outros que remanejaram suas dificuldades com êxito, depois de muito trabalho e muita paciência.
Rodrigo é formado em Artes e pós-graduado em Produção Multimídia. Diz-se apaixonado pela profissão de desenhista, dá palestras, gosta de usar a imaginação e a criatividade para realizar seus desenhos. Naoki Higashida tem hoje, 25 anos, adora escrever, já publicou diversos textos de ficção e não ficção e ganhou prêmios literários. Na Fundação Educando para a vida há uma frase que diz: O autismo é parte deste mundo, não um mundo à parte.
A história destes dois jovens e de tantos outros demonstra que as pessoas com autismo são diferentes, mas tão complexas como qualquer um de nós. Desde 1908, muitos estudos são feitos para tentar esclarecer este transtorno. Estima-se que ele atinja, atualmente, 1% da população, contando com 70 milhões de pessoas no mundo, sendo 2 milhões no Brasil. Em face desta situação, a ONU criou o Dia Mundial de Conscientização do Autismo, a fim de elucidar à população sobre a síndrome. Nesta data, que não por acaso é hoje, vários pontos turísticos do país são iluminados de azul, cor que simboliza o autismo. Como diz Jéssica del Carmen Perez, as crianças especiais, assim como as aves, são diferentes em seus voos. Todas, no entanto, têm direito de voar